Resumo: Artigo 36213
Dimensões sociais e de políticas públicas de tecnologias transformadoras: o caso dos transgênicos no Brasil (11, 57, 79)
Luisa Massarani, Fundação Oswaldo Cruz, BrazilIldeu Moreira, Universidade Federal do Rio de Janeiro, BrazilCarla Almeida, Fabio Gouveia, Museu da Vida/Casa de Oswaldo Cruz/ Fiocruz, BrazilEdna Einsiedel, Stelvia Matos, Jeremy Hall, University of Calgary, Canada.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 205 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 1 - Chair: Renato Dagnino
Abstract.
O objetivo de nosso estudo é analisar o processo de introdução das plantações transgênicas no Brasil, e da sua inserção nos marcos legais brasileiros, tendo como premissa de que se trata de um bom estudo de caso para se entender a complexa relação entre ciência, tecnologia, parlamento e sociedade. Isto porque a introdução dessa tecnologia no país tem sido polêmica e seu debate, iniciado nos anos 1990, mobilizou distintos atores sociais, resultou em marcos legais e culminou na nova Lei de Biossegurança, aprovada em 2005, que flexibiliza a liberação de alimentos e cultivos transgênicos no país. O uso dessa tecnologia na agricultura, aceita legalmente em alguns países e rejeitada em outros, extrapola fronteiras nacionais e engloba diversos aspectos: científicos, econômicos, políticos, sociais, culturais etc. Diferentes países e atores sociais reagem de maneiras diversas ao desenvolvimento e à aplicação dessa tecnologia. O Brasil, um dos maiores produtores agrícolas do mundo, foi palco de anos de acirrado debate e negociações; a aprovação da referida lei, no entanto, não reduziu as controvérsias em torno do tema. Investigamos o processo de consolidação desse marco legislativo (Lei de Biossegurança); o impacto da introdução, do desenvolvimento e da utilização dos transgênicos entre pequenos agricultores e outros atores sociais importantes na sociedade brasileira; a participação da sociedade e desses atores na tomada de decisões relacionadas à introdução dessa tecnologia no país. Além de nos basear na literatura existente sobre assunto e em notícias e matérias publicadas em veículos de comunicação de massa, realizamos cerca de 60 entrevistas com atores sociais envolvidos no processo, incluindo parlamentares e seus assessores, cientistas, organizações científicas, membros de organizações ambientalistas e de defesa do consumidor, representantes de pequenos e grandes produtores, de empresas de biotecnologia e de companhias agrícolas, jornalistas etc. Conduzimos também um estudo de caso com pequenos produtores rurais, em um total de 100 pequenos produtores, de quatro estados brasileiros. Entre os resultados e conclusões de nossa pesquisa, observamos que raramente na história brasileira um tema relacionado à ciência e à tecnologia foi tão discutido no Congresso Nacional com o envolvimento de distintos atores sociais. Isto foi também o reflexo de uma maior participação política na sociedade brasileira surgida nas últimas duas décadas. No entanto, neste caso específico, apesar dos esforços para um maior engajamento dos diversos setores sociais, chegamos à conclusão de que na verdade o papel efetivo dos distintos atores foi bastante reduzido no momento de tomada de decisão, mostrando que ao final se tratou de mais um exercício de auscultamento dos distintos setores sociais do que de efetiva participação democrática. Isto permite entender, inclusive, porque, apesar da promulgação da Lei de Biossegurança, a polêmica sobre os transgênicos continua acesa no seio da sociedade brasileira. Embora tenhamos identificado uma gama variada de discursos entre os pequenos agricultores indo desde os pouco informados até aqueles relativamente bem informados e articulados de uma maneira geral observamos que este grupo de atores sociais muitas vezes tinha uma visão mais ampliada do tema, considerando seus diversos aspectos (sociais, econômicos, ambientas, de saúde etc.), que os parlamentares, que muitas vezes adotavam uma argumentação mais direcionada a uma das facetas da questão mais diretamente ligada aos interesses que eles representam (por exemplo, aspectos agrícolas, no caso de um parlamentar da bancada agrícola). Expressando o debate público que ocorre no país, identificamos certa ambigüidade no discurso de determinados agricultores: por exemplo, sentimento de culpa entre alguns dos que cultivam transgênicos ou, entre vários dos que não cultivam, de estarem perdendo uma oportunidade econômica. Um ponto importante a ser registrado no estudo foi a grande disposição por parte de todos os atores sociais envolvidos em dar seus depoimentos sobre o processo; até mesmo senadores e deputados se prontificaram a receber os pesquisadores e a responder a seus questionamentos. Os pequenos agricultores, ao longo do desenrolar da pesquisa, manifestaram também grande interesse de ter mais informações sobre o que são transgênicos e seus potenciais impactos ambientais e na saúde, ou econômicos e sociais. Isto vem mostrar a necessidade grande de serem desenvolvidos programas mais sistemáticos de divulgação científica sobre tal tema e reflete também o grau de acentuado de confiança destes atores nos cientistas como fonte de informação qualificada.